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Fonte obrigatória para jornalistas, Claudio Lottenberg é fã de Chacrinha

Por Reinaldo Braga

 

O presidente do Hospital Israelita Albert Einstein (HIAE), Claudio Lottenberg, gosta de citar Chacrinha quando o assunto é comunicação. Bem articulado, o executivo – considerado um dos mais proeminentes de sua geração – está sempre à vontade com o flash das câmeras e o microfone, assim como o “ídolo” das tardes de domingo, falecido em 1988. Claudio é também um showman. Enquanto nosso fotógrafo se debruçava à procura do melhor ângulo para a seção de fotos, ele já havia encontrado a pose ideal. Sem nenhum comando, lança um olhar de intimidade para a lente da câmera. Inclina levemente o rosto. E a foto que abre essa matéria é produzida em menos de dois minutos. Em 2014, Claudio Lottenberg foi escolhido pela Revista Diagnóstico O executivo mais influente da saúde, com base na opinião da imprensa. A pesquisa foi feita no final do ano passado e ouviu jornalistas dos maiores jornais e revistas do país, incluindo O Estado de São Paulo, O Globo e a revista Veja. Ele ficou com 45% dos votos, seguido por Roberto d’Avila – então presidente do CFM (35%) e Alexandre Padilha (20%) – ex-ministro da Saúde.

“O jornalismo tem um papel educativo permanente”, reflete o executivo. “Essa deferência só me torna mais responsável sobre o conteúdo que expresso”. Tido como uma fonte obrigatória quando o assunto é gestão e assistência na área de saúde, Claudio raramente fala à imprensa utilizando off. Usa sempre seu aparato de comunicação, que inclui uma assessoria institucional e o staff do Einstein, para filtrar o que é ou não relevante. É sempre dele a última palavra na hora de atender ou não a um jornalista. “O bordão de Chacrinha, ‘quem não se comunica, se trumbica’, era uma visão quase profética do valor estratégico que a comunicação teria em nossos dias”, teoriza o executivo. Em uma busca rápida no Google, seu nome é citado em 41.400 resultados, entre links com o perfil profissional, entrevistas sobre diversos assuntos relacionados à saúde e contas em redes sociais. “É uma fonte obrigatória sobre política pública ou privada da saúde brasileira”, confidencia Claudia Collucci, setorista de saúde de A Folha de São Paulo. “Suas frases são sempre objetivas, diretas”. Ano passado, Claudio, que é doutor em oftalmologia pela Unifesp, também foi reconhecido como “Executivo de Valor”, premiação concedida pelo Jornal Valor Econômico. E recebeu o título de “Cidadão Sustentabilidade”, da Academia Brasileira de Marketing (Abramark). “Tive a sorte de me interessar pelo assunto comunicação”, conta ele, que reconhece ter tido ajuda de media training quando assumiu o comando do Einstein. “Há quem diga que existe apenas um tipo de executivo, o que discursa, enquanto os outros trabalham”, emenda o executivo, sobre sua habilidade de vocalização. “Mas há os que conseguem exercer as duas funções ao mesmo tempo”.

Seu estilo, definitivamente, faz a alegria da imprensa. Não foge de polêmicas, por mais embaraçosas que possam ser. Em um episódio recente, usou frases duras para atacar a reação de colegas médicos ortopedistas que consideraram uma “intromissão do Einstein” o projeto de segunda opinião na área de coluna conduzido pela instituição. O estudo fez parte de um programa pioneiro no país, que avaliou quase mil pacientes, entre 2011 e 2013. Desse total, menos da metade (41%) teve a indicação de cirurgia confirmada. Oitenta e oito por cento das indicações desnecessárias, segundo avaliação do Einstein, eram de alto custo. Claudio chegou a ser acusado nos bastidores de representar os interesses de grandes seguradoras – Bradesco Seguros, Sul América e a Marítima foram agentes financiadores do projeto. Foi a primeira vez na história do país que o overuse – tratamentos desnecessários, em tradução livre – ganhou as páginas dos principais jornais. “Queremos o melhor para o paciente e para o sistema de saúde como um todo, não para a fábrica de implantes”, polemizou, na época, o executivo, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo. O episódio foi considerado, por ele próprio, como uma das passagens mais delicadas de sua gestão à frente do HIAE. “Ainda assim, em nenhum momento senti meu equilíbrio abalado como mentor do projeto”, reflete hoje Lottenberg. “Um dos maiores méritos da iniciativa foi justamente questionar até onde vai a prática de incentivos na área de saúde”.

Workaholic – Às 4h da manhã, poucas horas antes do horário marcado para a entrevista, ele já estava de pé enviando e-mails para sua equipe com documentos que seriam avaliados pelo Ministério da Saúde. O objetivo era habilitar o HIAE para receber verbas do Pronon (Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica). “Se tem alguém que trabalha nesse hospital, sou eu”, diz, convicto. Sua rotina na instituição é mesmo espartana. Dá expediente todos os dias, além de estender a carga horária em “plantões” nos fins de semanas e feriados sempre que sua presença é necessária. “Minha vida é o Einstein”, justifica Claudio, que ainda encontra tempo livre para curtir os filhos gêmeos, Fábio e Gustavo, de 7 anos, fruto do seu casamento com a atual esposa, Ida Sztamfater. O executivo ainda mantém a rotina de cirurgias, a despeito da dedicação à carreira de gestor. Acumula também o comando da Lotten Eyes – um colosso, fundada por ele, com 16 unidades, espalhadas pela capital e interior paulista.

“O Claudio me fez enxergar a vida com outros olhos, literalmente”, disse à Diagnóstico o apresentador Luciano Huck, paciente e amigo pessoal do executivo. “Devo a ele o sucesso da minha correção de miopia há mais de 15 anos. Tenho grande admiração pelo médico e figura pública”. Engajado na comunidade judaica, Huck diz ser um admirador também da sua liderança religiosa – Claudio foi presidente do Confederação Israelita do Brasil (Conib) de 2008 a 2014. Político, não deixou em branco sua passagem – considerada “pouco conservadora” por alguns dos membros da entidade. Em um episódio contundente, que quase gerou uma crise política entre Brasil e Israel, ano passado, Claudio saiu em defesa dos brasileiros, em nome da Conib, diante da declaração de Israel de que o Brasil era um “anão diplomático”. “O Brasil errou ao definir como ‘desproporcional’ a ação legítima de Israel de se defender”, pondera o dirigente. “Mas a diplomacia de Israel não podia reagir de forma igualmente desproporcional e ofender a nós brasileiros”, defendeu o ex-dirigente, numa referência à réplica da chancelaria israelense, que, em tom de deboche, declarou que “desproporcional é o Brasil perder de 7×1 da Alemanha”. Internamente, a postura de Claudio não foi unânime até mesmo entre seus pares. Houve quem achasse que o Conib não deveria ter se envolvido em assuntos de diplomacia. “Não me arrependo das coisas que fiz. Costumo errar quando não ouço a mim mesmo”, afirma.

Famoso, bem-sucedido e com trânsito livre nas esferas do poder, Claudio Lotenberg tem status de autoridade pública. Nas últimas eleições presidenciais, fez questão de atender a convites para que recebesse em sua casa a presidente e então candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), atual líder da oposição. Se encontrou também com Eduardo Campos, já falecido, e Marina Silva – ambos do PSB. Da política, não nega o fascínio. “Acho que o Brasil precisa de pessoas boas que se interessem pela política”, comenta. Quem não a faz, acredita, corre o risco de ser governado por quem faz. Se todo “homem” é um ser político – no sentido amplo da palavra – Claudio exercita esse dom todos os dias, como poucos. É capaz de declarar amor em público ao seu staff, em tom personalista. “Deise é um presente de Deus em minha vida. É leal, honesta e extremamente dedicada”, comentou, se referindo à “amiga de longa data”, Deise de Almeida, diretora comercial e de marketing do Einstein, que o acompanhava na entrevista. Ao transitar pelos corredores do hospital, faz questão de cumprimentar a todos. “Quando você dá acesso às pessoas, elas abrem o coração para você. Ao experimentar essa abertura, você aprende”, diz, em tom professoral. “Isso ajuda a construir um cenário favorável como gestor”. O executivo faz questão de assinar, do próprio punho, um a um, todos os cartões de natal que o Einstein envia no final de ano a colaboradores, parceiros e políticos.

Notícias do mundo – “Lottenberg tem energia superior e sabe manter o equilíbrio entre a ciência e a fé. Como líder carismático, é inigualável”, faz coro o presidente do Lide – e maior referência do país quando o assunto é networking empresarial –, João Dórea. Claudio é também um dirigente que não abre mão de estar sempre bem informado. Costuma ser abastecido diariamente pela sua equipe de comunicação com tudo o que é notícia relevante ligada ao Einstein, à saúde brasileira e ao panorama internacional sobre healthcare. Em uma dessas clipagens reagiu com descontentamento a uma declaração do presidente da Interfarma, Antônio Britto. No texto, publicado em 2013, na edição 23 da Revista Diagnóstico, o mandatário da indústria farmacêutica havia dito que o Einstein poderia ser um hospital mais inovador, não fosse a instituição – citou outras –, uma ilha de excelência “cercada de impostos, burocracia e desconectadas da área privada”. Claudio ligou imediatamente para Britto e disse que ele não conhecia o Einstein para ter dito o que disse. E o convidou para visitar o hospital. Para quem presenciou o diálogo, o tom não foi amistoso. “Era uma reação que precisei ter sobre um episódio pontual, já superado, mas que, se mal administrado, poderia gerar desdobramentos ruins para mim e para eles (Interfarma)”, recorda.

Depois do posicionamento do Einstein, a assessoria de comunicação da Interfarma chegou a enviar uma nota para a redação da Diagnóstico atenuando o teor das declarações de seu dirigente. “Conheço e admiro o Claudio Lottenberg a partir de diversas perspectivas. Sou seu paciente, parceiro em diversas lutas pela saúde. E um admirador”, comentou Britto, jornalista de formação, para quem o episódio não passou de um mal-entendido. “O que mais me chama a atenção é a sua capacidade de agir aceleradamente sem perder a habilidade e o senso estratégico”. Ano passado, por indicação da Interfarma, Claudio foi escolhido para ser um dos líderes da Coalisão Saúde. O movimento, criado no final de 2014, reúne alguns do principais atores da saúde brasileira, a exemplo da Anahp, CMB e Fenasaúde, em prol de mais visibilidade e poder decisório nas políticas públicas para o setor.

Economia de US$1 – Obcecado por performance, Claudio não hesita em fazer cobranças para sua equipe, via e-mail ou por telefone, a qualquer hora do dia ou da noite. “Os empregos acabam às cinco da tarde. Carreiras não”, gosta de citar. A frase, revela, leu pela primeira vez em um outdoor, em Nova York, nas caminhadas entre o Hospital Manhathan Eye Ear and Throat e seu apartamento, durante sua estada para estudos nos EUA, em 1989. Ia de metrô e voltava andando, todos os dias. A economia era de US$1. “Pagava US$650 de aluguel. Poupava 5% do valor com as caminhadas”. À frente do Einstein – assumiu a presidência em 2001 –, triplicou o faturamento da instituição, que saiu de R$600 milhões anuais para R$2 bilhões.

Mais jovem executivo a presidir o HIAE, aos 40 anos, sua indicação, na época, foi vista com ressalvas. Uma pequena ala da cúpula do hospital o achava ‘prematuro’ para ocupar um cargo tão importante. “Claudio já era um expoente na medicina, tinha um relativo sucesso em sua clínica, mas não era tão experiente para ocupar a presidência do Einstein”, confidenciou um membro do conselho, na condição de anonimato. “Felizmente, a aposta acabou se provando, com o tempo, acertada”. Provocado sobre ao assunto, o executivo mantém a serenidade. “Eu mesmo pensei, naquele momento, sobre minha indicação. Será que é para já? Se não for eu, quem?”, lembra, parafraseando o filósofo judeu pré-cristão, Hillel, o Babilônico.

Aos 54 anos, Claudio está no quinto mandato à frente do HIAE, que se estende até 2016. “Deixarei para o próximo presidente um legado positivo, assim como os que me antecederam”, comenta ele. “Mas não vou me desligar do hospital tão cedo”. Seu é objetivo é presidir o conselho deliberativo, “se a sociedade assim acolher”. Nos bastidores, como todo bom político, já prepara um sucessor: o médico gastroenterologista Sidney Klajner, vice-presidente da instituição. Discreto, Klajner tem um perfil bem diferente de Lottenberg. É mais introspectivo, apesar de também ser precoce para o cargo (46 anos) e com carreira igualmente brilhante na medicina. “A referência de Claudio é sempre inspiradora. Quem quer que o substitua vai conviver com parâmetros elevados de comparação”, disse Klajner à Diagnóstico. Para Claudio, o cargo de presidente do HIAE, que não é remunerado, traz naturalmente prestígio. Permite ser uma voz que repercute na sociedade e, obviamente, capaz de transformar. “Mas também é trabalhoso. O compromisso de quem assumir a gestão desta instituição será, sempre, com a perenidade do Einstein”, profetiza. Ao ser questionado se aceitaria o convite para ser ministro da Saúde, ele reflete, depois de uma pausa – a única de toda a entrevista. “Não posso dizer que nunca passou pela minha cabeça participar de um cenário no qual pudesse colocar minhas ideias naquilo que só um ministro da Saúde pode fazer”, sugere, para depois cravar. “Levaria em consideração um eventual convite”. Uma ponderação que, na política, significa um sonoro “sim”. A simpatia do “quarto poder”, ao que parece, ele já tem.

 

*Entrevista publicada na revista Diagnóstico n° 29.



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